domingo, 27 de novembro de 2016

Um homem livre que não acreditava no livre-arbítrio

Clarence Darrow

O advogado norte-americano Clarence Darrow (1856-1938) defendia que não existe livre-arbítrio. Curiosamente, muitas das suas ações parecem ser (pelo menos aos olhos de um defensor do livre-arbítrio) exemplos lapidares de liberdade.

Os pais de Richard Loeb e Nathan Leopold - dois adolescentes de Chicago que raptaram e assassinaram um rapaz contra o qual nada os movia, “apenas para provar que conseguiam fazê-lo”1 – contrataram Clarence Darrow para os defender. Loeb e Leopold já tinham admitido ser culpados, pelo que, de acordo com a legislação vigente, teriam de ser condenados ou à prisão perpétua ou à pena de morte. Darrow, que era um conhecido adversário da pena de morte, conseguiu que os rapazes fossem apenas condenados a prisão perpétua. A sua argumentação baseou-se na seguinte ideia: não existe livre-arbítrio e, portanto, Loeb e Leopold não foram responsáveis pelo que fizeram.

Noutro caso judicial célebre em que participou estavam envolvidos o líder de um sindicato de ferroviários e uma companhia de comboios. Inicialmente Darrow era advogado dessa companhia, mas demitiu-se para poder defender o sindicalista no tribunal, tendo perdido bastante dinheiro com a troca, pois este pagava-lhe muito menos que a companhia ferroviária. Darrow valorizava o dinheiro e quando os seus clientes podiam pagar cobrava honorários elevados, mas também defendeu muitas pessoas pro bono (gratuitamente) ou por pouco dinheiro. 2

«Darrow era conhecido como o paladino das causas impopulares – defendeu sindicalistas, comunistas e um negro acusado de ter morto um membro de uma turba racista. No seu caso mais famoso defendeu John Scopes, do Tennessee, da acusação de ter ensinado a [teoria da] evolução numa aula do ensino secundário. (…) Em 1902, tendo sido convidado pelo diretor da Prisão de Cook County para dar uma conferência aos presidiários disse-lhes o seguinte:

Na verdade, não acredito minimamente no crime. No sentido habitual da palavra, não existem crimes. Não acredito em qualquer distinção entre as verdadeiras condições morais das pessoas que estão dentro e das que estão fora da prisão. São iguais. Do mesmo modo que as pessoas que estão aqui dentro não poderiam ter evitado estar aqui, as pessoas que estão lá fora também não poderiam ter evitado estar lá fora. Não acredito que as pessoas estejam na prisão porque o mereçam. Estão na prisão apenas porque não puderam evitá-lo, devido a circunstâncias que ultrapassam inteiramente o seu controlo e pelas quais não são minimamente responsáveis.» 3

Notas:

1 James Rachels, Problemas da Filosofia, Gradiva, Lisboa, 2009, pág. 155.

2 Wikipédia, “Clarence Darrow”: https://pt.wikipedia.org/wiki/Clarence_Darrow

3 James Rachels, op. cit., pág. 156.

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